Destas mãos que falam, saem gritos d'alma, gemidos de dor, às vezes, letras com amor, pedaços da vida, por vezes sofrida, d'um quase iletrado escritor. Saem inquietações, também provocações, com sabor, a laranjas ou limões. Destas mãos que falam, saem letras perdidas, revoltas não contidas, contra opressões, das nossas vidas! (Alberto João)

quarta-feira, 26 de outubro de 2011

30 anos após morte da filha, André Bamberski rapta assassino, leva-o para França e fá-lo condenar


«É ao mesmo tempo uma história de amor a um filho, de amor à justiça, de persistência invulgar - mais do que invulgar: raríssima - e também de coragem.


- André Bamberski (esquerda) e Dieter Krombach (direita) -

André Bamberski, um contabilista francês, tinha uma mulher e uma filha. Em 1975, a mulher trocou-o por um médico alemão chamado Dieter Krombach, homem elegante e vaidoso.

A filha de Bamberski, Kalinka, uma bela jovem de 14 anos, foi um dia passar férias a casa do padrasto, em Lindau, junto ao lago Constança. E já não regressou.

Apareceu misteriosamente morta na sua cama. A autópsia foi inconclusiva, embora o dr. Krombach admitisse tê-la injectado com Kobalt-Ferrlecit, um medicamento perigoso. Disse que o fizera para ajudar Kalinka a ficar bronzeada mais depressa.


Indícios deliberadamente ignorados


O dr. Krombach era (e é) um homem proeminente na sua terra. Ao que parece, beneficiou da proteção empenhada dos seus pares, e terá mesmo estado presente na autópsia, segundo o relatório oficial.

Talvez isso ajude a perceber por que as marcas evidentes de violência na vagina de Kalinka, e o líquido esbranquiçado lá encontrado, não foram tidos em conta.

Também a injeção de sucessivos produtos pelo dr. Krombach no corpo da rapariga quando ela já estava morta foram ignorados. O ministério público alemão arquivou o caso.

Coube ao francês reabri-lo. E uma segunda autópsia revelou um facto extraordinário: o aparelho genital de Kalinka havia sido integralmente retirado.

 

Um médico sem escrúpulos



Se o pai já suspeitava de malfeitoria, a partir daí teve a certeza. E ao longo dos anos foi incansável a exigir justiça.

A investigação francesa determinou uma acusação, mas as autoridades alemãs recusaram extraditar o médico. Julgado à revelia, em 1995 foi condenado a 15 anos de cadeia. A sentença seria mais tarde anulada por motivos puramente processuais: ao não permitir o recurso em julgamentos à revelia, a lei francesa ofendia a convenção europeia dos direitos do homem. Deste então, e em consequência desse caso, a lei foi alterada.

A salvo na sua terra, o dr. Krombach não permaneceu calmo. Em 1997, foi condenado - com pena suspensa - por violar uma doente de dezasseis anos, no seu escritório, após a drogar. Outras mulheres o acusaram do mesmo, mas as autoridades disseram que faltavam provas.

Em 2006, nova condenação, por fraude e exercício ilegal de medicina, já que Krombach se encontrava inibido de praticar. Desta vez, como não estava em causa a mera morte de uma adolescente e sim as prerrogativas de uma importante classe profissional, o médico cumpriu dois anos de cadeia.

 

O rapto e a conclusão


Faltava fazer justiça. Perante a crescente evidência de pressões de bastidores a favor de Krombach, Andrei Bamberski tomou o assunto nas suas mãos.

Já várias vezes tinha ido ter com o médico para o informar de que jamais teria paz. Em 2009, foi mais longe: mandou raptá-lo. O preço terá sido vinte mil euros. Krombach apareceu amarrado, amordaçado e ferido à porta do ministério público na cidade francesa de Mulhouse. Identificado, recebeu assistência médica e ficou preso.

A Alemanha tentou levá-lo para casa, mas desta vez foi a França a mostrar-se intransigente. E há dias Krombach, agora presencialmente, foi condenado a 15 anos por homicídio involuntário.

Antes da sentença, entrevistado pelos media, Bamberski afirmava a sua convicção sobre a culpa do médico: "Não 'suspeito', não 'imagino'. Tenho a certeza"

Enfrentando ele próprio um julgamento criminal por rapto, mostra-se tranquilo: "A minha vida teria sido muito mais fácil se eu tivesse tido a cobardia de dizer, 'Bem, está morta', e seguido em frente".»


in Expresso online, 25-10-2011

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"Horta do Zorate" é um blogue pessoal, editado por Alberto João (Catujaleno), cidadão do mundo, fazedor desencostado, em autoconstrução desde 1958.